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Voo no escuro




Petrificado.

Queria ter tentado mais.

Claro que valia a pena, mas minha reação à adversidade foi de paralisia generalizada.


Petrificado.

Um coração gelado, áspero e em decomposição foi o que restou.


Eu precisava daquele abraço, eu precisava do toque,

do afago, do acalento,

mas o imprevisto me contaminou.

O medo se tornou uma sombra maior que eu.


Andar pelas ruas cantarolando não mais adiantava.

As orações se espatifaram no escuro.


É! Estou no escuro!

O limite não vejo mais, o perigo pode estar mais perto do que imagino,

mas não consigo enxergar um palmo a minha frente.


Sinto um cheiro diferente:

Um aroma doce no início,

mas que acentua depois um fétido corpo em deterioração.


Sou eu mesmo. Eu que estou petrificado.

O odor vem dos cacos que tô tentando realinhar.


Só me resta voar nesse escuro, com asas encurtadas pela dor e pelo imprevisto,

mesmo que não haja um limite visível, eu só quero voar.


Sentir o vento da liberdade,

sentir um pulsar que traz calor a um coração em ruínas,

respirar fundo e engasgar procurando por mais fôlego.

Talvez a motivação pra’inda permanecer no escuro seja essa:

Eu preciso aprender a voar.


Cansei de me arrastar no caminho,

Tô exausto de puxar a perna ferida

E tentar equilibrar o corpo num estado de crise.

Os pés rasgados pelas pedras pontiagudas não precisam mais sofrer.

É hora de reconstruir as asas, retomar a postura de um pássaro livre e voar.


Ainda que haja um obstáculo mais à frente,

ainda que tenha uma sombra maior pra me engolir,

eu só preciso voar,

sair da minha própria decadência.


Será o primeiro, mas sei que pode ser o último.


O importante é tentar.

O risco pode ser alto, o custo pode ser caro.

Mas eu quero voar.

Mesmo que galhos imprevisíveis rasguem o que sobrou das asas.

Mas eu quero voar.

Eu, pelo menos, terei tentado!



Felipe Hilan Guimarães

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